O sistema de ensino do Japão, apesar de muitos requerimentos, procedimentos padrões, regras e cobranças, é geralmente muito elogiado por pessoas de outros países, desde os uniformes escolares dos alunos, o respeito aos professores e as instituições de ensino, as estruturas escolares, métodos de aprendizados, entre outros pontos.

O sistema geralmente é bem visado a ponto de estrangeiros que vão morar lá procuram colocar os seus filhos nas escolas japonesas, porém, o choque de cultura e a dificuldade com a língua e adaptação podem tornar isso algo bem complicado para as crianças encararem. No entanto, algumas regiões onde possui um alto índice de estrangeiros vivendo no Japão, há a possibilidade de contar com escolas e creches para alunos estrangeiros.

Cidade de Hamamatsu, uma das cidades japonesas com grande quantidade de habitantes estrangeiros, incluindo muitos brasileiros.

Na cidade de Hamamatsu, na prefeitura central de Shizuoka, há um tipo especial de creche. Há 40 ou mais crianças de países como o Brasil, o Peru e as Filipinas. Seis deles estão entre as idades de seis e dez anos, o que significa que elas deveriam frequentar a escola primária sob a lei japonesa. A NHK conduziu recentemente um estudo com especialistas para estimar o número de crianças estrangeiras que não frequentam o ensino fundamental ou médio. Os cálculos são baseados em pesquisas do governo sobre residentes e escolas estrangeiras.

O estudo descobriu que cerca de 120.000 crianças estrangeiras com idades entre 6 e 14 anos estavam vivendo no Japão até o ano de 2018. Acredita-se que cerca de 8.400 crianças não frequentaram a escola. Estas crianças não são abrangidas pelos inquéritos anuais de frequência conduzidos pelos governos central e local. Segundo a lei japonesa, os nove anos de escolaridade, do que chamamos no Brasil de Ensino Fundamental I e II.

Esta creche na cidade de Hamamatsu tem uma sala de aula especial para crianças entre as idades de seis e dez anos. (imagem: NHK)

Segundo informações da equipe da NHK, há suspeita que os governos locais não sabem onde e como essas crianças estão vivendo. Alguns podem já ter retornado a seus países de origem ou poderiam estar frequentando escolas não autorizadas para cidadãos estrangeiros.

Uma sala de aula sem professor:

Maria se mudou para o Japão do Brasil com seus pais e irmão mais novo em Novembro de 2017. Ela tem sete anos, mas ainda vai para a creche com seu irmão Enrique, que tem quatro anos.

Quando ela chega na escola, ela vai para uma sala de aula especial para as crianças mais velhas. Tem mesas, cadeiras e um quadro branco. Maria e seus amigos mais velhos estudam, inglês, matemática e outros assuntos com livros escolares do ensino fundamental brasileiro. Mas não há professor.

Maria e as crianças mais velhas têm que estudar sozinhas. Há membros da equipe que ajudam, mas não possuem credenciais de ensino. A escola opera a sala de aula especial sob a política que oferece suporte acadêmico, mas não escolaridade.

Maria, 7 anos de idade, ainda vai para a mesma creche como seu irmão Enrique, de 4 anos. (imagem: NHK)

Os pais de Maria, que estão na faixa dos 20 anos, trabalham para uma fabricante de autopeças como funcionários contratados. Eles ouviram sobre a creche de sua agência de recursos humanos. Seus colegas disseram que a escola apoia muito as famílias brasileiras que vêm ao Japão para trabalhar. O pai de Maria sai de casa todas as manhãs às seis horas para ir a uma fábrica na cidade de Toyohashi, província de Aichi, que fica a cerca de uma hora da cidade de Hamamatsu. Ele trabalha das 7 às 19 horas, cinco dias por semana. A mãe de Maria trabalha em outra fábrica e também trabalha de manhã até a noite.

“Contamos com a creche para cuidar de nossos filhos porque temos que trabalhar longas horas para aumentar nossa renda e estabilizar nossas vidas”, diz o pai de Maria.

Ele acrescenta que estava planejando que Maria frequentasse uma escola pública japonesa de ensino fundamental, mas mudou de ideia depois que alguém que ele conheceu disse que seus filhos não tinham conseguido se adaptar devido a diferenças de idioma, cultura e costumes.

O pai de Maria está especialmente preocupado com o bullying e a discriminação. Ele pensou em matriculá-la em uma escola particular para estudantes estrangeiros, mas diz que ela era muito cara: “Estamos cientes de que a creche Maria não é uma instituição educacional”, diz ele. “Queremos que nossos filhos tenham a melhor educação possível, mas não temos dinheiro suficiente para enviar Maria para uma escola para crianças estrangeiras. Conhecemos Maria e Enrique como sua creche, então achamos que continuaremos a enviar eles lá por enquanto.”

Autoridades de Hamamatsu estão trabalhando em um projeto para que crianças estrangeiras em idade escolar se matriculem nas escolas o mais cedo possível. Eles estão realizando pesquisas porta-a-porta para encontrar crianças que não estão na escola. Mas convencer os pais é um desafio.

“Não podemos matricular as crianças se os pais não querem que elas estejam na escola”, disse um oficial de Hamamatsu. “As crianças precisam aprender coisas adequadas à sua faixa etária. Queremos que elas aprendam no ambiente adequado, como em escolas de ensino fundamental e médio, escolas para estudantes estrangeiros. Se permanecerem no Japão, precisam obter qualificações para a formatura do ensino médio. para que possam conseguir emprego. Tentamos dizer aos pais o quanto é importante que os filhos frequentem a escola”.

O professor associado Yoshimi Kojima, da Universidade Aichi Shukutoku, diz que a principal razão pela qual crianças estrangeiras não frequentam escolas é porque o sistema de ensino obrigatório do Japão não cobre cidadãos estrangeiros.

A creche tem cerca de 40 crianças estrangeiras. Seis deles estão entre as idades de 6 e 10. (imagem: NHK)

Com base na nova legislação aprovada em Abril para aceitar mais trabalhadores estrangeiros, o Ministério da Educação do Japão diz que planeja realizar uma pesquisa nacional sobre a questão das crianças estrangeiras que não frequentam a escola.

Com política adequada e escolas que atendem aos desafios de aprender em uma segunda língua, o Japão deveria ser capaz de ajudar crianças como Maria a lutar por seus sonhos.

“Um dia, eu quero me tornar uma médica e cuidar dos meus pais”, diz ela.

Fonte: NHK World (Asako Wada, Asuka Miyake)

Quer ficar por dentro dos mais recentes artigos, notícias, eventos e outros destaques do Mundo OK? Siga-nos pelo FacebookTwitter e Instagram.