Falta de ética

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O conceito de ética, no dizer de Renato Shimmi vincula-se ao agir nas relações entre os seres humanos e entre estes e a natureza, visando sempre ao bem-estar do outro e da coletividade.

Nos dias de hoje falar em ética, na verdade, significa falar em crise ética em um mundo dominado pelo materialismo exacerbado e consumismo ilimitado. Só que, nem todos os países do mundo, apesar da evolução para a modernidade, não perderam as raízes de sua tradição cultural. Confrontemos as culturas do Japão e do Brasil que são apostas.
No Brasil, vige a cultura do individualismo, do egoísmo que corresponde ao agir sem ética. Sem ética, a pessoa por mais inteligente, culta e competente que seja somente conseguirá construir um mundo sem sentido, vazio de calor humano, um mundo construído para si próprio, a fim de satisfazer o seu ego. Esse tipo de ação leva à exclusão desta ou daquela pessoa, deste ou daquele grupo social que não dançam de acordo com o rítimo da música que ele toca.

No Japão vigora o coletivismo que corresponde à ação com ética capaz de construir um mundo onde reine a paz e harmonia, a segurança, a ordem e o respeito ao próximo e à natureza.

O agir sem ética corresponde a um aventureiro que elege como norte “colher os frutos sem plantar a árvore”. Iguala-se aos grandes navegadores da idade média que só buscavam riquezas para explorar, extraindo os recursos naturais de forma predatória. Resultado: o Brasil ganhou uma parte de seu território transformado em deserto, por ação predatória desses aventureiros sem ética.

O individualismo constrói abismos que separam alguns poucos que vivem como nababos, de uma multidão de famintos que vivem abaixo da linha da pobreza. O coletivismo constrói pontes que ligam as pessoas e estas à natureza.

O homem ético é aquele que, ao invés de buscar o triunfo procura superar as dificuldades visando a construção de um espaço político-social onde impere o respeito, a ordem e a gratidão. Para agir com ética a pessoa não precisa ser inteligente, competente e nem erudita. Basta, tão só, agir sem individualismo, sem egoísmo, sempre de forma desinteressada, isto é, buscando apenas o bem-estar da coletividade e respeitando-a em quaisquer circunstâncias. A ética não comporta adjetivação ou relativização. A chamada “ética da conveniência” é, na verdade, falta de ética.

Há, na verdade, uma tendência mundial de a sociedade atual guiar-se pelo equivocado discurso do “ter”, alavancado pelo consumismo sem limites. Como o ato de consumir é sempre efêmero, pois a cada avanço tecnológico outras novidades desejadas vão surgindo, acaba transformando o homem em uma vítima de um círculo vicioso na busca pelo “ter”.
Contudo, no Japão há ainda a empatia entre as pessoas; não há desníveis socioeconômicos acentuados como no Brasil. Há respeito pelo próximo e pela natureza, expresso por meio de comportamentos diários.

Exemplo de individualismo enraizado é a sociedade brasileira dominada pelo “ter” sem limites, como bem demonstram as recentes operações da lava jato. Disso resulta governantes individualistas que fingem não enxergar as disparidades econômicas e sociais. Esse comportamento aético acaba refletindo um Estado, igualmente, sem ética, perdulário com seus órgãos tomados por corrupção desenfreada, incapaz de construir um espaço público de igualdade, a fim de conferir a todos o mínimo de dignidade humana.

Kiyoshi Harada
Jurista com 32 obras publicadas. Acadêmico da Academia Paulista de Letras Jurídicas, da Academia Brasileira de Direito Tributário e da Academia Paulista de Direito.