O PEQUENININHO

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O presidente de um país europeu, ao encontrar-se com um jovem africano, brincou com o rapaz, comparando o carvão com a cor da sua pele. Se você ouvir ou ler a respeito disso não acredite, é fake-news. Políticos importantes em todo o mundo, por mais safados que sejam, nunca iriam cometer uma indelicadeza desse tipo. Indelicadeza seria um termo ainda leve, uma coisa dessa deve ser classificada como total falta de educação, uma selvageria no trato com uma comunidade. Mas dá para acreditar que o presidente do Brasil, ao encontrar-se com um jovem japonês, disse ao rapaz que seu negócio é pequenininho? Não contente, alguns dias depois ele, falando a respeito da reforma da previdência do seu ministro o Guedes, disse que as modificações seriam mínimas, parecidas com as coisas dos japoneses. Se isso fosse noticiado em qualquer lugar do planeta, as pessoas diriam que não passa de fake-news, que é coisa inventada pela oposição. Mas no Brasil de hoje, essas maluquices passaram a fazer parte do cotidiano político.

Na verdade, isso não chegou a chocar pessoas conscientes, que analisam pessoas e fatos de forma serena a racional e não estão apegados aos fanatismos e fantasias criadas em torno de determinados políticos. Assim como não acreditamos no messianismo de Lula, tampouco consideramos o presidente um mito. Olhando o passado do presidente Jair Bolsonaro, seus discursos, seu posicionamento político sobre os mais variados assuntos, principalmente os de moral e costumes, era isso mesmo que se esperava dele. A grande maioria que votou nele, e ainda mantém obstinada devoção à sua figura, não fez e nem está fazendo em função do seu passado, de seus atos ou de suas posições na vida pública, mas tão somente baseado em um discurso político, muito bem azeitado e distribuído pelas redes sociais. Assumiu uma posição totalmente anti-petista, falou mal dos políticos (não esquecendo que ele foi deputado federal por 28 anos), mas não apresentou nenhum plano de governo e escondeu várias de suas posições sectárias. Venceu a eleição no blá-blá-blá, vendendo uma imagem do que ele não é. Havia ainda uma pequena esperança de que ele começasse a se encaixar nessa imagem depois de empossado, esperança que vai aos poucos morrendo com os escorregões seguidos em suas falas e medidas. E alguns membros de sua equipe ministerial, que ele vai trocando como se troca de camisa, parecem saídos das piores histórias de terror.

Essa agressão verbal que ele fez contra os orientais e seus descendentes é típica de gente sem escrúpulos, de gente que não teve educação. Durante a vida ouvimos piadinhas a respeito do assunto, mas vindas de gente ignorante e recalcada. Nunca uma pessoa ocupando um cargo público importante pronunciou tal desatino. Em função da repercussão dessa sua infeliz fala, era de se esperar um pedido formal de desculpas por parte do presidente, ou mesmo um pronunciamento enaltecendo os brasileiros de olhos puxados. Mas sua rusticidade ética é tamanha que nem percebeu o que fez. Nós, nikkeis brasileiros, não merecemos esse tipo de tratamento. A elite da comunidade, que são os dirigentes das principais entidades, bem que podiam se posicionar sobre o assunto. Já tarda a publicação de um manifesto simples, mas duro, das principais entidades nikkeis (coreanos e chineses também poderiam aderir), repudiando essa fala infeliz do nosso presidente. Porque não somos qualquer um no meio da população. Se todos os orientais e seus descendentes cruzassem os braços, esse país morreria de fome, de doença, os dentes iriam apodrecer, muitas obras públicas e privadas nem iriam sair do chão, só para citar algumas das atividades onde temos destaque. Porque para nós, a cabeça grande que importa é a que está em cima do pescoço, porque a de baixo, mesmo sendo pequena, nos dá muito prazer e muitos filhos.