Opinião: Crise na USP

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Alguns meses atrás, a população paulista assistiu desolada a mais uma crise na Universidade de São Paulo, com uma greve que durou mais de cem dias. Ficamos sabendo que a USP, só com a folha de pagamentos, gasta mais do que a polpuda verba que recebe do governo do estado, que vem do meu, do seu, do nosso suado dinheirinho, arrecadado nos IPVA, ICMS e outros tantos impostos… 

Se fosse escola particular estava arrebentada, teria que fechar as portas. Mas como é uma escola pública, vai sobrar para o governo do estado dar um jeito nos déficits, que pelo andar da carruagem, tende a crescer cada vez mais. Como sou um ignorante e só sei fazer as coisas simples, dividi a verba anual pelo número de estudantes. São 5,7 bilhões de reais em 2014, para um pouco menos de 90.000 estudantes, o que dá por volta de R$ 63.000,00 por aluno, ou doze parcelas mensais de R$ 5.250,00. Mesmo descontando o que é gasto com pesquisas e outras despesas paralelas, ainda assim é um custo muito alto por aluno.  Depois ficamos sabendo que a parte da folha de pagamentos para funcionários é bem maior do que a parte que vai para os professores. A conclusão que este ignorante chega é que não é pouca coisa que tá errada, mas quase tudo chega à beira do absurdo. Ou é feita uma mudança geral ou vai ser o caos total, com crise todos os anos. E o mais alarmante é que quem paga, o verdadeiro dono da USP, o povo paulista, nem é chamado para opinar. Deveria, através de um plebiscito, ser consultado para dizer se concorda em manter este sistema, que privilegia muitos que podem pagar (que provavelmente é a maioria), além de contratar irresponsavelmente milhares de funcionários, que através de greves e chantagens, conseguem arrancar aumentos muito acima da inflação? Só para exemplificar, o ex. e o atual reitor estão na lista do que recebem mais do que o governador, o que é ilegal. Não dá para generalizar e taxar todos os professores e funcionários de privilegiados, mas a situação mostra que é necessária uma ampla reforma na política salarial, não só na USP, como também na Unicamp e na UNESP.

Sou contra a universidade pública totalmente gratuita. Num país subdesenvolvido como o Brasil, o ensino superior é um luxo. Um país onde milhões de crianças são obrigadas a frequentar a escola pública e receber um nível de ensino sofrível (de professores despreparados que recebem salários miseráveis), não pode gastar verbas tão robustas para que as classes privilegiadas continuem a formar os seus doutores. Nas universidades públicas os alunos poderiam optar em pagar durante ou após a conclusão, mas tem que devolver um benefício que vai lhe trazer grandes vantagens pessoais. E não me venham com a história de que depois de formados devolvem para a sociedade em forma de impostos e trabalho. Quem não cursa faculdade pública e principalmente os que nem conseguem terminar um curso superior, também pagam os mesmos impostos e trabalham do mesmo jeito, geralmente em atividades mais cansativas e menos lucrativas. E regras duras para os que demoram muito para se formar ou que desistem do curso. Isso tudo tem que ser cobrado.

Naturalmente que estas são medidas difíceis de serem implementadas. No país onde o povo se acostumou a mamar nas tetas do dinheiro público, mesmo leis claramente injustas são difíceis de serem removidas, porque fica no imaginário de quem ainda não é beneficiado (e provavelmente nunca será), que um dia poderá também entrar na “mamata”. E aí não existe o clamor popular por mudanças. Em todo o mundo civilizado, o ensino básico é que recebe atenção especial dos governos, com escolas públicas de primeiro grau, gratuitas e de alta qualidade, inibindo a existência de escolas particulares, como acontecia aqui até os anos 60. Concluído o básico de qualidade, a partir daí cada um faz a sua escolha e paga por elas, com o governo premiando somente os mais competentes com bolsas. Isso seria socialmente justo. Hoje os pobres cursam o fundamental e o ensino médio de qualidade sofrível, entrando com grande desvantagem em relação aos jovens da classe média, na disputa pelas vagas nas universidades públicas. O poder público tenta remediar com cotas e outras invencionices que não resolvem o problema. E continuamos a financiar com dinheiro público a educação das classes média e alta, quando elas deveriam pagar por isso. Este mesmo dinheiro que poderia melhorar o nível das escolas públicas de base. Cabe aos políticos, a quem delegamos a formulação das leis, decidir se estes privilégios são cabíveis ou não. Políticos decidir alguma coisa séria? Tá brincando!!! No país dos Tiriricas talvez nossos netos ou bisnetos venham a viver uma época de seriedade dos políticos. Porque eu… já desisti!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br.