Opinião: De bananas e macacos

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Infelizmente, a luta contra a discriminação racial no Brasil é feita de forma totalmente equivocada, cujos efeitos práticos são poucos e lentos. Enquanto ofensas contra negros ricos e famosos são destacados na mídia de forma espetacular, atos realmente discriminatórios, prejudiciais principalmente no cotidiano dos negros mais pobres, continuam a acontecer de forma camuflada, sem que nada de objetivo seja feito…

Nelson FukaiMesmo que a campanha mundial deflagrada após a atitude do jogador Daniel Alves tenha absoluto sucesso – e nunca mais os jogadores sejam xingados de macaco ou que uma banana seja atirada em campo -, que influência isso vai ter na discriminação das quais os negros pobres sofrem no Brasil? Porque no cotidiano, na vida profissional, social e até pessoal, as atitudes camufladas de racismo vão continuar a acontecer impunemente. Não que ofensas raciais não tenham de ser punidas, mas com o seu peso relativo. A atenção exagerada dada a estes casos midiáticos de ofensa, acaba desviando a atenção das questões mais profundas de racismo existentes no país.

No programa “Bem Amigos” de algumas semanas atrás, o jogador são-paulino Luis Fabiano começou sua manifestação sobre o caso que envolveu o atleta Tinga, dizendo que na sua opinião a xingação era apenas uma forma da torcida adversária tentar perturbar o emocional do jogador; não via isso como ato de racismo. Como jogador e como negro, sua opinião no caso era de fundamental importância, pois, provavelmente ia relatar casos concretos de preconceito que teria sofrido e que nada tinham a ver com essa história de ser chamado de “macaco”. Mas, nem deixaram o jogador terminar o raciocínio, o apresentador passou rapidamente a palavra para outros comentaristas, que como bom fazedores de média, pediram punições severas aos que fazem os xingamentos. Não interessa aos racistas camuflados discutir com seriedade o problema da discriminação racial no Brasil, é melhor ficar neste debate superficial e agradar a plateia com críticas repetitivas e demagógicas. O cantor Jair Rodrigues, também presente no programa, quando indagado, afirmou nunca ter sido  discriminado em sua vida. Pura demagogia que não ajuda em nada. Pode ser que depois de ter alcançado o sucesso e faturado muito dinheiro, isso tenha acontecido, mas, quando era um simples ajudante de alfaiate, no início dos anos sessenta, certamente deve ter sofrido discriminação. Mesmo hoje, tente ele passar numa barreira policial dentro de um carro de luxo, não mostrando o rosto, mas a cor da sua pele.  Certamente vai ser barrado e não é por causa dos óculos escuros e nem do chapéu. Naturalmente que vai ser solto quando descobrirem quem é.

Porque o problema no Brasil, antes de ser racial, é social e financeiro. Ninguém que ganha muito dinheiro neste país e adquire um certo status social, quer negros em sua intimidade, nem eles mesmos. Todos os negros brasileiros que ganham muito dinheiro (principalmente jogadores de futebol), praticamente sem exceção, são casados com mulheres brancas. Nos Estados Unidos, negros ricos e famosos são quase todos casados com negras. O presidente Obama lidera esta lista. Quais são as razões para que negros brasileiros ricos não tenham o mesmo comportamento dos negros americanos? Uma discussão séria sobre discriminação racial poderia começar por uma análise profunda desta questão. Talvez os negros brasileiro estejam precisando de uma injeção de autoestima, de auto-valorização e a consciência de que são capazes de conquistar o fim da discriminação por conta própria e não através de leis que pretensamente os defendem, mas que na realidade os discriminam ainda mais. É preciso acabar com essa história de que o Brasil tem uma dívida com os negros. Se depender do resto da população essa dívida nunca vai ser paga e a discriminação nunca vai acabar. No máximo vão ficar com essa farsa de Secretaria Especial dos Direitos Raciais, as cotas nas universidades e nos concursos públicos, atingindo os poucos negros da classe média (que já são privilegiados) e as leis para castigar quem chama o negro de macaco. No que interessa mesmo, o racismo camuflado vai continuar a existir. A chave para acabar com a discriminação está nas mãos dos discriminados. E isso só vai acontecer quando maciçamente eles tiverem destaque na sociedade em geral e não somente nos esportes e nas artes. Muitos médicos, muitos engenheiros, muitos dentistas, muitos advogados, muitos chefes, muitos gerentes, muitos empresários, quando os negros chegarem a esta condição, certamente não serão mais discriminados. O percurso é longo e penoso e exigirá muita dedicação e esforço. Quem quer ajudar a combater a discriminação tem que mirar nestas questões. O resto é demagogia!!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br.