Opinião: Chega de esmolas

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Desde criança, o que significa mais de 50 anos atrás, ouço falar que as regiões mais ricas do país deveriam ajudar as mais pobres, até que o desenvolvimento atingisse a todas de forma mais uniforme. E nesse tempo todo, dezenas de trilhões de reais foram tirados do centro-sul do país e enviados para o norte-nordeste, sem que estas regiões se tornassem auto sustentáveis…

_Nelson FukaiA má aplicação desses recursos e a roubalheira generalizada acabaram por viciar os estados dessas regiões atrasadas, que pouco se esforçam e ficam cada vez mais dependentes de recursos federais para sobreviverem. Durante a ditadura militar, mais precisamente no governo do general Geisel, a dependências que o regime tinha dos estados do norte e nordeste para manterem a maioria no congresso, obrigou a dar a estes uma representação maior do que eles tinham, proporcionalmente ao número de eleitores. E esta regra maluca e irracional que funciona até os dias de hoje, estabelece que o número de deputados federais por estado é proporcional ao número de eleitores, “respeitados o mínimo de 8 e o máximo de 70”. Assim São Paulo, com mais de 28 milhões de eleitores, tem direito a eleger 70 deputados e Amapá, com apenas 360 mil eleitores, tem direito a 8 vagas. Ou seja, um voto do Amapá tem o mesmo valor de 9 votos paulistas. Como nas últimas décadas inflaram o número de estados nas regiões mais pobres e o número de senadores por estado é de três, qualquer que seja o número de eleitores, a representação das regiões norte e nordeste no Congresso Nacional é uma verdadeira aberração. Aproveitando-se dessa força numérica, os políticos dessas regiões mantém, quando não aumentam, uma distribuição de verbas perversa, onde estados mais ricos ficam financiando os estados mais pobres indefinidamente.

O estado de São Paulo envia anualmente para o Tesouro Nacional, via impostos federais, cerca de 205 bilhões de reais e recebe de volta tão somente 23 bilhões. Na outra ponta, o estado do Maranhão, do coronel Sarney, envia menos de 2 bilhões de reais, mas recebe de volta, mais de 9,8 bilhões. E assim acontece com todos os estados do norte-nordeste (exceção do Amazonas que é beneficiado pela Zona Franca), que não conseguem pagar suas contas sem a ajuda das verbas federais. Resumindo, estados do sul-sudeste do país trabalham para sustentar o resto do país. Se recebesse aos menos metade do que manda para os cofres federais, o estado de São Paulo receberia mais de 100 bilhões de reais, gerando um montante de investimentos capaz de colocar seus habitantes num nível de vida semelhante aos melhores do mundo.

O Brasil vive hoje a sua pior crise desde os tempos imperiais. Mais do que a péssima situação sócio-econômica do país, é a falta de perspectivas que preocupa os brasileiros. A presidenta Dilma, despreparada e fragilizada, não consegue ao menos apresentar um plano mínimo, mesmo que de pequenas ações localizadas, para estancar a sangria. O país clama por reformas, mas não consegue eleger representantes que os façam. O PT foi uma esperança que acabou em fiasco. E a primeira reforma é a eleitoral, devolvendo aos estados mais populosos uma representação proporcional. E no embalo, fazer a reforma fiscal, onerando com impostos diretos as camadas mais ricas da população. Mas a reforma que pode revolucionar o país é o do reordenamento federativo. Estados que não se tornarem auto suficientes após um determinado período, devem ser rebaixados à categoria de território, sem direito a governo local (governadores, deputados estaduais e secretarias) e à representação no Congresso Nacional. Isso obrigaria estes estados que hoje são deficitários, a cortarem drasticamente as despesas desnecessárias (que em muitos casos são desvios) e a aumentar a arrecadação, ou seja, trabalhar mais. Não dá mais para aguentar esse discurso dos estados ricos ajudarem os pobres já não mais. Parodiando o velho provérbio chinês, já mandamos as varas, já mandamos as iscas, já construímos os lagos e até jogamos os peixes dentro deles, mas eles insistem em não pescar. Chega de esmolas, precisamos parar de mandar o peixe pronto!

NELSON FUKAI é engenheiro, escritor e analisa questões do presente e passado da comunidade nipo-brasileira. E-mail: nelsonfukai@yahoo.com.br.